15.11.08

Crónica curta sobre coisas compridas (e que se enrolam).

Espero por ti no intervalo de uma das tardes compridas na biblioteca de física. Sempre que me sento no degrau de lata verde-garrafa, reparo na minha sombra, a enrolar-se na da árvore velha, que deve ser respeitosamente comprida a caminho das nuvens, nunca olhei para cima, tantas vezes aqui me sentei, e que num novelo escuro desce as escadas até ao alcatrão daquela curva que nenhum carro consegue fazer à primeira.
A calma com que enrolo uma noz do tabaco comprado a meias na papelaria do Lumiar, logo a seguir à esquina do cabeleireiro do maricas brasileiro e das três quarentonas louras, que começam a falar sobre lagostins grandes e vermelhos sempre que eu passo, onde toda a gente faz o euromilhões e ninguém ganha nada, assusta-me. Os meus dedos são indiferentes ao frio que vem com o vento enrolado da esquina e à personalidade viva do meu pessimismo, que é como uma máquina de pipocas a estalar bocadinhos de nervoso miudinho, descontrolada. Fiz uma barriga ao cigarro por estar a olhar para a sombra, decido que não faz mal, talvez demores uns minutos, vai dar jeito um cigarro comprido.

Sei sempre quando levantar a cabeça, sorrio com a certeza que, lá de cima, com o teu cabelo de sombra que enrola com o vento da esquina, vem um novo alento, num passo desajeitado de pernas compridas de fazer inveja. Sorris de volta.

Aqueces-me com um beijo, enrolas-te em mim para afastar o frio e eu sinto o cigarro tremer na ponta dos dedos. Assustas a minha indiferença.

4 comentários:

Alhita disse...

zé continua!!! é so o que te digo...
gosto e muito:)

Em Bicos de Pés disse...

Muito bem, sim senhor. Gostei particularmente da 'máquina de pipocas a estalar bocadinhos de nervoso miudinho'.

Ookami disse...

Não devias fumar, faz-nos pensar demasiado ;)

Abraço

Anónimo disse...
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.

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